Reflexões sobre o parto humanizado

18/07/2018 Iara Castro

O parto é um evento especialmente delicado para se trabalhar na Psicologia Perinatal. E o tratamos com tamanho cuidado, por ser um momento permeado por questões históricas, culturais, médicas, psicológicas e pessoais. Ou seja, o parto merece toda nossa atenção e escuta respeitosa.

Deparo-me com frequência com questões de gestantes relativas à escolha do “tipo de parto”: normal ou cesárea? Natural? Humanizado? Dúvidas, nomenclaturas e diferentes propostas. Mas, acima de tudo: expectativas e idealizações pessoais.

Percebemos atualmente, uma tendência positiva nas mulheres em se tornarem mais ativas na escolha de seu parto – quando possível. Muitas têm realizado estudos pessoais, conversado com especialistas, buscado orientações, e algumas vezes, idealizado uma forma de parto determinado. Mas afinal, qual seria a melhor forma de parto?

A “desumanização do parto humanizado”

Meu objetivo com esse texto não é defender, criticar ou reforçar um caminho único para o parto de todas as mulheres. Afinal, isso seria uma enorme violência. Não existe resposta única. Não existe regra. Devemos sempre destacar que não podemos falar de TODAS as mulheres, nem para TODAS as mulheres.

Mas, devemos sim, apoiar para que cada mulher se torne consciente de sua história, de sua condição médica, de seu desejo e possa ser ativa dentro do ambiente onde está inserida. Ou seja, que ela exerça o poder que lhe é de direito, lutando por suas escolhas pessoais.

Assim, gostaria de propor uma reflexão sobre o parto humanizado. Atualmente, o parto humanizado tem sido tratado como uma forma de resposta às diversas intervenções médicas e violência obstétrica que infelizmente, ainda são praticadas. Muitas vezes idealizado, o parto humanizado tem sido colocado como um espaço único para a expressão das mulheres em sua unicidade. Porém, percebo que essa busca por afirmação, tem levado o parto humanizado para um lugar que podemos chamar de “parto orgástico”. Através de uma supervalorização e divulgação pública do parto, com nuances de espetáculo.

Seja pela violência, seja pela exibição exacerbada, o que temos são formas de não lidar (ou lidar com pouca reflexão), com as nuances envolvidas no evento. O parto diz sim, de sexualidade. E, usualmente, sexualidade é tratada como um aspecto íntimo do sujeito. Quando tratamos de algo íntimo, que nos traz questões pessoais (algumas difíceis de lidar) tendemos a criar protocolos, formas de nos colocar em um lugar de controle. Assim, quando determinamos que o pai corta o cordão, que tem que ter uma trilha sonora no ambiente, que a mãe tem que amamentar no primeiro minuto – acabamos por “desumanizar o parto humanizado”.

O parto humanizado humano

Um parto que nos traz regras e protocolos diferencia-se de forma disfarçada dos tipos de parto anteriormente praticados e suas violências. Um parto realmente humanizado deveria tratar da singularidade da mulher e do casal no ambiente de parto. O que é importante para esse homem e essa mulher? Ele deseja cortar o cordão umbilical? Consegue enxergar o sentido nesse ato? E a mulher deseja amamentar no primeiro minuto?

Assim, um parto realmente humano é aquele que adquire significado para essa mulher. Onde ela se sente segura para falar, verbalizar (se assim desejar), onde se sente acolhida e pode então, acolher tudo o que vem de dentro. Nesse caso, não apenas o bebê, mas seus sentimentos, medos e inseguranças. Onde ela pode ser quem é e encontrar o que deseja.

Um parto humanizado é um parto singular. O parto daquela mulher, naquela história, naquele momento. Na medida em que se torna um ato repleto de protocolos, falamos de obrigações e perdemos o caráter subjetivo. E então, perdemos humanidade.

Porque muitas vezes, se pensa no bem da parturiente, negando a parturiente. E então? Vamos lutar pela humanização do parto humanizado?